Cavalas suadas

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Aqui vai mais um excerto do “Tubarões Voadores 2” que, se correr tudo bem, dará (muito) boas notícias em breve…
#fingerscrossed


Mas avancemos já para a encomenda das mil e seiscentas cavalas para o aquário Nausicaá, em Boulogne-sur-mer, fechada durante o Trail Run açoriano de 2017 e que já contava com duas entregas muito bem-sucedidas. A primeira, de apenas vinte raias-violeta, tinha sido efectuada por mim, pelo Francisco e César durante setembro de 2017, apenas uma semana depois de ter chegado da Sérvia. A segunda foi logo a seguir, e o Rui Guedes, André e Francisco entregaram mais de dois mil carapaus açorianos. Restava-nos apenas mais uma entrega de cavalas e outra de peixes-lua para recebermos as largas dezenas de milhares de euros que ainda estavam na conta francesa, mas eu tinha pressa em metê-los na nossa conta da Caixa Geral de Depósitos na Horta.

Contudo, à medida que 2018 ia progredindo, não eram muitos os progressos que chegavam nas chamadas telefónicas que mantinha com o Filipe, meu antigo aluno e também antigo colaborador da Flying Sharks, então a trabalhar para a Tunipex e responsável pela ‘Secção de Peixe Vivo’. Os meses iam passando e nada de cavalas, o que me obrigava a repetir a mesma resposta ao cliente, vezes sem conta: “Está quase… Só mais um bocadinho de paciência… Je suis désolée…” e afins… Lá para junho, estava a ficar realmente à rasca, mas as operações da Tunipex estavam demasiado intensas para conseguirem apanhar os bichos. Só em julho chegou o tão esperado telefonema a confirmar a captura das cavalas, faltando só, por isso, a marcação do transporte.

Neste ponto tivemos novas dificuldades variadas… primeiro, era o cliente que não podia receber os bichos na data que propus; depois, era a temperatura que estava demasiado alta, mas finalmente lá apontámos para dia trinta e um de julho, depois de várias desmarcações e remarcações, para tentarmos escapar a uma onda de calor que se anunciava. A internet revelava temperaturas na casa dos vintes em França, por isso metemo-nos a caminho o mais rápido possível, carregando aproximadamente duas mil e trezentas cavalas, algumas das quais capturadas apenas uns dias antes, para garantir que tínhamos um número suficientemente alto.

Impõe-se aqui um pequeníssimo intervalo, mais propriamente no dia dezanove de julho, em que chegou um muito antecipado telefonema da Editora Bertrand, a quem tinha submetido as 450 páginas do meu manuscrito ‘Tubarões Voadores’, depois de uma excelente recomendação da extraordinária Rita Canas Mendes, a quem estarei eternamente grato até ao fim dos dias. A meio da manhã, estava eu com a Nina em frente à óptica Alain Afflelou, na Praça de Londres, quando me ligou a Bárbara Soares, meu contacto na Bertrand. Admito que as mãos me tremiam quando vi o nome da Bárbara no écran do telemóvel. O telefonema chegava alguns dias depois de ter enviado o manuscrito ao director editorial, Eduardo Boavida, e só podia encerrar o veredicto. O coração batia-me quase com tanta força como viria a bater meses mais tarde enquanto aguardava pelo telefonema da IVI e, tal como nessa ocasião, o veredicto era positivo!

O ‘Tubarões Voadores’ seria publicado com uma editora à séria, daquelas que colocam esforço efectivo na selecção, edição e promoção das suas obras, ao invés do método de vanity publishing, com o qual esbarrei quando andava à cata de uma editora para os ‘Sex, Sharks and Rock & Roll’, escritos em inglês.

Note-se que pagar para publicar – ou auto-publicação – não é em si um problema e são cada vez mais os autores que recorrem a esse método, uma vez que podem reter cem por cento do produto da venda dos seus livros, em vez de apenas dez por cento, que é a percentagem standard num contrato com uma editora tradicional. O problema da vanity publishing é que nem todas as empresas que se oferecem para auxiliar o autor se anunciam como tal, adiantando um discurso que é rigorosamente idêntico ao de uma editora tradicional, mas só depois do livro lançado é que surgem as duas enormes diferenças que distinguem estes métodos:

A primeira, é que a esmagadora dos manuscritos são aceites, o que queima de imediato o autor, que fica associado a uma marca que não prima pela qualidade, mas meramente pela quantidade; a segunda é que o autor, depois de pagar uma massa para publicar o seu livro, espera naturalmente por uma ‘campanha de marketing’, que é prometida contratualmente mas cedo descobre que essa ‘campanha de marketing’ se restringe a uns press-releases e à colocação da venda dos livros em pouquíssimos locais, tradicionalmente de visibilidade obscura. Pior ainda, mesmo que os esforços do vanity publisher consigam colocar alguns títulos em livrarias tradicionais, a marca está queimada, porque os leitores sabem que os seus livros são um produto de venda massificada, sem o controlo editorial – isento – que pauta a actividade do mercado literário tradicional.

Mas não nos deixemos cair em choraminguice, até porque estou infinitamente grato à Chiado, a vanity publisher com que finalmente consegui editar o primeiro dos três volumes que viriam a compor a trilogia (em inglês) ‘Sex, Sharks and Rock & Roll’, mais que não seja porque foram os primeiros a dizer-me um ‘sim’, depois de anos a receber rejeições a todas as mensagens – cirúrgicas e altamente personalizadas – que enviava a todos os agentes literários em Nova Iorque, Londres e Los Angeles, incluindo editoras que aceitam manuscritos não agenciados. A vida é feita de lições e esta foi uma delas, por isso cerremos os dentes, punhos fechados e voltemos ao transporte das cavalas para La France.

Em retrospectiva, admito que nos precipitámos em transportar os bichos no nosso fantástico contentor de quarenta pés, já equipado de alto abaixo com os tanques, inversor, iluminação e demais equipamento. Já o tínhamos usado em várias viagens marítimas e rodoviárias e a verdade é que todos os transportes tinham corrido de forma exemplar. Mas o nosso precioso contentor, apesar de repleto de qualidades, tinha um tremendo defeito, que era a total ausência de qualquer mecanismo de controlo de temperatura. Esse foi um dos motivos pelos quais adiantámos o transporte, tentando ter as cavalas em França antes da maldita onda de calor que meteu a Europa, incluindo Portugal, a bater nos cinquenta graus centígrados. Olhando agora para trás, teria sido melhor mudar todos os tanques para um camião refrigerado, mas isso implicava dias de trabalho e recordemos que a internet referia temperaturas na casa dos vintes em França. Adiar o transporte estava fora de questão, porque todos sabíamos que as temperaturas infernais que se avizinhavam iriam selar o destino dos pobres bichos em Olhão, onde os tanques estavam ao sol e com filtração muito rudimentar.

Na madrugada do dia trinta e um carregámos, por isso, perto de duas mil e trezentas cavalas, mas uma falha de comunicação inexplicável (e rara) com a TPO (empresa de camionagem que contrato habitualmente) obrigou-nos a ter o contentor ao sol até às quatro da tarde, por falta de motoristas com horário disponível para arrancarem na viagem de dois mil e cem quilómetros que tínhamos pela frente. Apesar dessa espera frustrante, as temperaturas pareciam estar a aguentar-se e o sol ia baixando lentamente, o que significa que o troço mais temível da viagem – o tórrido e abrasador centro de Espanha – seria percorrido de noite. E assim foi que nos metemos ao caminho, rumando primeiro a Huelva, depois Mérida, Cáceres, Salamanca, Valladolid, Burgos, Vitoria-Gasteiz, sempre a olhar pela janela e focando todos os nossos pensamentos na descida do sol, como se o poder da mente fizesse a Terra girar mais depressa.

Trocámos de condutores perto de Salamanca, saltando para a cabine os simpáticos Barbosas, pai e filho, que nos levariam até ao destino, que se previa a menos de vinte e quatro horas de distância a partir desse ponto. Uma das vantagens de já termos feito este percurso é que sabíamos que tínhamos trinta horas de caminho entre Olhão e Boulogne. Passámos a fronteira francesa pouco depois do nascer do sol do primeiro dia de agosto, com temperaturas efectivamente a rondar os vinte graus, qualidade de água estável e nenhuma mortalidade. Vangloriámo-nos pelo grande par de cojones que tínhamos exibido ao nos metermos à estrada, mas arvorámos a nossa bandeira de esperteza saloia definitivamente cedo demais, porque a maldita onda de calor não estava a viajar de sul para norte – como normalmente ocorre – mas sim exactamente ao contrário…

Foi com profundo horror que íamos olhando para o termómetro da Audi velhota (que já levava com mais de setecentos mil quilómetros na lombada) e em cujo tablier esperávamos ver números decrescentes à medida que rumávamos para norte, como aconteceu em todos os transportes anteriores. Mas não foi isso que o visor mostrou…

Contrariando as previsões cibernéticas, a cada centena de quilómetros para norte era adicionado mais um grau à temperatura exterior e outro à temperatura da água, que bateu nos vinte e sete graus no final da tarde, a meia-dúzia de horas do destino. Tivemos, nesse transporte, as nossas primeiras mortalidades sérias desde a catástrofe dos bacalhaus congelados (em 2012), que os leitores da publicação anterior reconhecerão. O ambiente de boa disposição, que reinava desde a partida, rapidamente deu lugar a uma modorra intensa, com todos os dedos – incluindo os meus – apontados a mim, o Capo di tutti capi, que tinha tido a ideia brilhante de poupar trabalho à equipa usando o contentor, em vez de armadilharmos um camião frigorífico. O facto irónico é que a minha tentativa de poupar trabalho era efectivamente à equipa de Peniche, porque eu nunca tenho tempo para o trabalho laborioso de carregar tanques e equipamento dentro dos camiões, ou mesmo contentor. Mas a minha simpatia pelos rapazes estava a revelar-se catastrófica, particularmente aos olhos do Rui Guedes, que estava a fazer o transporte comigo e com o David, estando o Rui habituado a um nível de performance sem paralelo na equipa dos Açores. Era visível quanto lhe doía na alma cada vez que retirava uma cavala morta de um tanque, eventualmente verbalizando que estava absolutamente horrorizado com o calvário a que estávamos a sujeitar os animais.

Implorei aos Barbosas que acelerassem o mais possível e lá chegámos finalmente a Boulogne, depois de momentos verdadeiramente dramáticos ali pelas bandas de Poitiers, Tours e Le Mans, onde devemos ter tirado perto de uma centena de animais dos tanques, particularmente dos que tinham sido capturados mais recentemente. Os que foram capturados há mais tempo revelavam enorme resistência à temperatura elevadíssima da água, sem dúvida porque já tinham passado por valores similares no quentíssimo verão olhanense.

Eram onze da noite quando chegámos a Nausicaá, onde o Stéphane Henard, e toda a sua equipa, aguardavam por nós. Implorei-lhe que desse água – fria (!) – aos meus rapazes e tranquilizou-me, indicando que tinha quatro potentíssimas bombas que iam mudar a água dos nossos tanques de transporte enquanto o diabo esfrega um olho. Depois agarrou em mim e levou-me ao hotel onde tinha reservado três quartos para nós, porque aparentemente as leis laborais francesas não permitem que ninguém seja sacrificado com um turno nocturno num hotel, pelo que tinha de apanhar as chaves nos próximos minutos, ou arriscávamo-nos a termos de dormir no carro. Expliquei ao Rui e David que me ia ausentar breves minutos, mas que já aí vinha água fria em abundância, com a qual se podia começar a trocar a água dos tanques, antes das cavalas serem descarregadas nos imponentes dez mil metros cúbicos de água do tanque High Seas, com o dobro do volume do Tanque Central do Oceanário.

Já com as chaves dos quartos no bolso, voltei com o Stéphane para o camião, onde esperava ver os tanques já com os níveis de água a serem reduzidos, depois de uma aclimação necessariamente rápida às condições da água de destino. Mas não. O que vi foi o Rui e David perfeitamente à nora com o desaparecimento da equipa de franciús que, percebi mais tarde, estavam a lidar com as bombas que deveriam trazer água, aparentemente todas avariadas.

“Está aqui uma belle merde!…” pensei, não particularmente surpreendido porque este cenário de falta de preparação à chegada dos nossos carregamentos é infelizmente comum, contrastando com o elevadíssimo calibre de profissionalismo que colocamos nos nossos transportes – embora este não fosse um bom exemplo.

Depois de alguma insistência, lá consegui pôr o Stéphane a meter gás nos membros da equipa, que finalmente engendraram uma ligação manhosa entre uma bomba ultra-potente e uma mangueira claramente desadequada, com uma ligação enxertada com a nossa fita-cola, num festival de amadorismo que dava dó. Mas, apesar do mau aspecto da ligação, a verdade é que a nova bomba tinha uma capacidade surpreendente, por isso tínhamos finalmente os nossos tanques a receberem água fantasticamente mais fresca – sequencialmente – enquanto a nossa bomba ia retirando – também sequencialmente – água dos mesmos.

Assim que um tanque estava despachado desta troca de água, dávamos início à captura das cavalas com os tradicionais aros redondos e sacos de plástico transparentes, que o David manobrava com maestria. Aproveitei para pedir um comprimido para as dores de cabeça à equipa do Stéphane, porque os meus já tinham marchado todos com a ansiedade das horas anteriores e estava com uma enxaqueca que nem me deixava pensar. Subitamente, no meio de tanta desgraça, apercebemo-nos de alguma comoção dentro do aquário.

Uma vez que as cavalas estavam a ser introduzidas no tanque principal, aparentemente as mais fracas estavam a ser rapidamente removidas da cadeia alimentar pelos tubarões que habitavam no tanque, num comportamento que tinham impregnado nos genes depois de milhões de anos de evolução. Este facto era triste para as cavalas, mas convenhamos que nenhuma cavala morre de velha no mar, enfrentando destino similar no bucho de um predador ou, pior ainda, morrendo de asfixia amontoada num cabaz de pesca, sendo essa asfixia ligeiramente mitigada com pazadas de gelo que lhes atiram para cima.

Embora os momentos fossem dramáticos para as cavalas mais fracas, os tubarões estavam visivelmente agradecidos à fantástica equipa de tugas, que lhes trouxeram uns acepipes ímpares, dignos de lamberem as barbatanas, se pudessem. Mas esta ocorrência David Attenboroughiana, tinha um significado muito prático para nós, fornecedores, e os meus olhos cruzaram-se com os do David e Rui num esgar malicioso, que disse tudo sem precisarmos de dizer nada. Apesar de estarmos cem por centíssimo seguros de termos entregado bem mais do que as mil e seiscentas cavalas vivas – sendo o número de sobreviventes à razia predatória bem superior a este valor – a verdade é que não havia forma de o cliente confirmar efectivamente o número de animais entregues, pelo que se considerou que a encomenda estava saldada quando finalmente apertámos a mão ao Stéphane e caminhámos para o hotel, apreciando o ar fresco com que a beira-mar Boulognense nos brindava.

O Rui comentou “João Correia, tu realmente nasceste com o rabo virado para a lua!… Só mesmo tu é que te safavas numa encomenda destas, que tinha tudo para ser uma catástrofe…” Rimos nervosamente, pela primeira vez em várias horas, e despedimo-nos baixinho, à porta dos nossos quartos, até às nove da manhã do dia seguinte.

Dois de agosto amanheceu de forma esplendorosa, com um sol radioso e a deliciosa sensação de dever cumprido. Tínhamos mais umas dezenas de milhares de euros a caminho da conta, faltando apenas entregar quatro peixes-lua, o que seria facilmente executado numa carrinha Europcar, poupando-se o custo – e tempo – de voltar a Boulogne de camião. Bem mais difícil foi tomar o pequeno-almoço, porque o restaurante associado ao hotel estava equipado para servir cafés e bebidas, mas desconhecia o conceito de petit dejeneur. Mesmo ao lado vimos uma padaria, mas apetecia-nos sentar e saborear três croissants repletos de manteiga e três café au lait bem quentinhos, apesar do dia de verão fabuloso que se fazia sentir no exterior. Encontrámos finalmente um pequeno café, onde pedi este menu ao rapaz que estava atrás do balcão, notando que ele saiu porta fora, enquanto nos sentávamos, voltando três minutos depois com os nossos croissants, claramente adquiridos na padaria ao lado. O menu petit dejeneur incluía, para além de croissant e café au lait, um belo sumo de laranja, esperando nós identificar pequenas grainhas de laranjas – das que crescem nas árvores. Mas não tivemos essa sorte. Levámos com uma beberagem à la Tang, acompanhada de croissants secos e sem qualquer guarnição. Nem um pacotinho de manteiga ou de doce de morango, daqueles tão sintéticos que se sente a reacção química que lhes dá sabor. “Tanta coisa com a gastronomia franciú, bem podiam ir a Peniche aprender a fazer uns croissants mistos prensados e um galão com pés e cabeça, carago…” comentámos, num momento de pequena xenofobia que considerámos justificado.

Seguiu-se uma breve passeata no aquário, onde o Stéphane nos mostrou as lindíssimas cavalas, que nadavam numa bola assustada, mas sincronizada, tentando iludir os muitos predadores que ainda as tinham debaixo de olho. Tirámos selfies com o nosso estimado cliente e, o mais rápido que as regras de cortesia nos permitiam, sentámo-nos na Audi e ala p’ra casa, que se faz tarde! Fiz o primeiro turno ao volante, e bombei umas belas horas até um ratinho começar a dar horas em três barrigas profundamente insatisfeitas com o pequeno-almoço françolês. Já não me lembro qual de nós se lembrou de procurar um ‘Buffalo Grill’ no Waze, porque levávamos uma jantarada de carne grelhada fisgada enquanto conduzíamos para norte, uma vez que sabíamos haver um perto do hotel. Contudo, como é tradicional nestas passeatas, a nossa jornada terminara bem depois da hora de encerramento de todos os restaurantes de Boulogne, pelo que o nosso desejo teve de ser satisfeito em Rouen, debaixo de um calor abrasador e 4que ultrapassava os quarenta graus.

Seguiram-se mais horas de condução pelo crematório francês, durante as quais a pobre Audi se aguentou heroicamente, mantendo a temperatura do óleo sempre abaixo dos noventa graus, apesar do ar condicionado bombar no máximo e a temperatura exterior rebentar o mercúrio de todos os termómetros. A meio da tarde conduzi um pouco mais e reparei que o pobre motor não conseguia desenvolver potência adequadamente, provavelmente porque o ar estava tão quente que se tornava menos denso e, portanto, oferecendo menos oxigénio à explosão que se dá no interior dos cilindros.

Conhecia muito bem este fenómeno dos meus voos particulares, porque o valente Cessna 172 descola da pista de Tires em menos de trezentos metros nas passeatas de inverno, quando o ar está frio, mas come mais de metade da pista no verão, quando o ar pouco denso oferece bem menos sustentação. E porque é que tal acontece, interrogar-se-ão? A explicação é incrivelmente simples: quanto mais alta é a temperatura, maior é a actividade das moléculas que ocupam, por isso, maior volume. O mesmo número de partículas num volume maior significa, por definição, uma menor densidade. Quando a temperatura desce, o fenómeno é inverso, com as mesmas moléculas a exibirem comportamento mais letárgico e, portanto, estando mais juntas e ocupando menor volume, ou seja, maior densidade. Nestes momentos nunca consigo evitar uma pontinha de emoção por quão maravilhoso é o universo e todas as suas leis e regras, que lentamente vamos descobrindo através do processo científico. Por vezes dou por mim a pensar que, na nossa geração, é bem possível que vejamos descobertas tremendamente impactantes, particularmente ao nível das micro-partículas e mecânica quântica. Não esqueçamos que equipamentos modernos permitiram em 2017 quantificar as extraordinárias ondas gravitacionais, teorizadas pelo grande Einstein, cem anos antes. Quem sabe com que maravilhas a Ciência nos irá brindar nos próximos anos? Tendo em conta que se aproximava o momento de eu e a Nina gerarmos um bebé proveta, com a ajuda dessa mesma Ciência, já nos imaginava sentados, os três, em frente à televisão, daí a uns anos, a testemunharmos a chegada do primeiro Homo sapiens sapiens a Marte, e quem sabe que outros prodígios o nosso Rumi teria oportunidade de ver?…

Apesar do calor, o resto da viagem decorreu sem incidentes, com uma breve paragem em Bordeaux para um belo Donaldo e um muito saboreado pequeno-almoço, pelas sete da manhã de dia três, na terra do David, Torres Novas, ainda completamente a dormir, à excepção de um simpático café numa praça, onde pudemos finalmente saborear três galões e três torradas de pão caseiro, que nos souberam pela vida!

Poucas horas depois estávamos em minha casa, regressando o Rui aos Açores uns dias mais tarde, mas ainda apanhou a fustigante onda de calor, que marcou quarenta e cinco graus e meio na Audi, quando fui com a Nina buscá-lo ao Colombo, depois de vermos mais uma bela cinemada de sábado.

Sem aulas, com poucos emails e encomendas Flying Sharks, dediquei o resto do mês de agosto a corrigir, editar e melhorar o manuscrito do ‘Tubarões Voadores’. O mês incluiu ainda uma nova visita à clínica IVI, uma vez que o doutor Samuel já tinha regressado de férias e receitou um verdadeiro cocktail hormonal à pobre Nina, que tinha de se injectar na barriga com várias hormonas, com o objectivo de maximizar a produção de óvulos, com data de extracção marcada para o último dia do mês, que se aproximava rapidamente.



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