
‘Tá bonito, está…
Aqui vai mais um artigo que o Observador teve a amabilidade de publicar aqui.
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Enquanto saboreava um belo leitão com um grande amigo meu e discutíamos projectos futuros alucinantes, escapou-me a vista para um televisor que, no canto da sala e (felizmente) sem som, ia passando as novidades do momento. Estas incluíam preciosidades como “França disponibiliza-se para apoiar Ucrânia com arsenal nuclear”, “China está pronta para guerra comercial – ou qualquer tipo de guerra – com Estados Unidos”, “Alemanha declara investimento de 500 mil milhões para defesa” e a lista continuava de tal forma animada que tive de tomar algum bicarbonato de sódio quando cheguei a casa, ou não conseguiria digerir o repasto.
Todas estas pérolas, claro, na sequência dos trágicos 11 minutos em que, no dia 28 de fevereiro, J.D. Vance e Donald Trump enxovalharam o pobre Zelenski, pouco depois de ser questionado acerca da ausência de fatos no seu roupeiro, num momento de brilhantismo jornalístico que deverá ter deixado Woodward & Bernstein orgulhosos. A isto seguiram-se as brilhantes tarifas para com o Canadá e México, principais parceiros comerciais dos E.U.A., que automaticamente condenaram os preços de todos os automóveis (e não só) a subirem em flecha, já que o fabrico dos componentes destas máquinas, na América, é partilhado por estes três países, um pouco à semelhança do que os países europeus fazem dentro da U.E.
De repente, o mundo ficou virado de pernas para o ar.
Ironicamente, ou deveria dizer “assustadoramente”, tudo isto segue à risca o que o José Rodrigues dos Santos narra no seu “O Protocolo Caos”, focado na estratégia russa de recuperar o império perdido. Este rumo não é muito diferente do chinês, que pretende celebrar o centenário da sua revolução, em 2049, com o papel hegemónico pelo qual lutam incansavelmente, também ele alvo da investigação aguçada do J.R.S. em “A Mulher do Dragão Vermelho”, lançado há dois anos.
Ou seja, já todos percebemos que o presidente americano é o que se denomina vulgarmente como um “idiota útil” e está a facilitar o propósito russo de anexar a zona leste da Ucrânia, como vassalo muito bem-mandado que é. Desprovido de apoio militar americano e completamente rebentado por três anos de bombardeamentos de uma máquina de guerra infernal, Zelenski não terá grandes hipóteses senão ceder os terrenos conquistados e andar com a sua vida para a frente, encaixando uns trocos pelos minerais raros que vai vender ao Tio Sam.
Mas não nos dispersemos.
Meia dúzia de dias depois da invasão da Ucrânia pela Rússia, há três anos, comentei com um colega que me pisgaria de Lisboa à primeira menção de “Portugal” por parte de Putin. Isto porque – estrategicamente – Portugal é um alvo perfeito para os russos passarem uma mensagem de “não se metam connosco”.
Ora pensem bem.
Portugal é suficientemente relevante para despoletar choque na comunidade internacional e votos de repúdio por parte de todos. Quem sabe se é desta que o BE e PCP finalmente repreendem as acções do tio Vlad, em vez de as justificarem?
Por outro lado, Portugal é suficientemente pequeno para uma agressão russa não justificar o início da terceira guerra mundial.
Sejamos pragmáticos, se Vladimir Putin enviar uns daqueles balázios ultra-sónicos para Berlim, Paris ou Londres, já sabe que Moscovo, São Petersburgo e Vladivostoque desaparecem do mapa um quarto de hora depois.
Mas um balázio russo em Lisboa, ou em Beja, ou Montemor-o-novo, ou (…), mostra a todos que o tipo não estava a brincar quando demonstrou os mísseis Oreshnik ultra-sónicos, babado, no final de 2024, no dia em que alterou a doutrina nuclear russa.
O curioso é que ando com este pensamento na cabeça há três anos e jurei que, ao menor vislumbre de perigo, agarrava na minha família e mudava-me para o meio duma montanha remota. Mas, como uma boa rã na panela, vou vendo as referências a “Portugal” na televisão russa multiplicarem-se e deixo-me estar, confiante na capacidade dos nossos líderes em evitarem uma catástrofe de proporções planetárias.
Os mesmos líderes que parecem ser incapazes de governar mais do que um ano e meio seguido sem terem de ir a eleições. Umas alegações de corrupção aqui, umas quotas de empresa familiar acolá, tudo serve para se gastarem uns milhões em eleições a cada meia dúzia de meses, enquanto tudo fica parado à espera de novo consenso.
Mas voltemos ao meu plano brilhante de fugir de Lisboa quando as coisas aquecerem com a Rússia, o que parece estar iminente. É triste admiti-lo, mas é mais fácil teclar umas linhas no Areeiro, e enviá-las para um órgão de comunicação social, do que passar a vida nos websites das agências imobiliárias, à procura de um apartamento barato atrás do sol-posto.
É precisamente nesse espírito de “deixa andar que vamos todos ficar bem” que me apetecer solicitar aos nossos líderes que mantenham um low profile e não atraiam demasiada atenção para nós, porque a última coisa que queremos é um Vladimir numa sala com um botão vermelho e um monitor que mostra o Oceanário com uma cruz em cima…
Não é sem embaraço que escrevo estes pensamentos, porque manda o meu/nosso ego latino que nos ergamos, peguemos em armas, e defendamos os nossos irmãos ucranianos contra a tirania russa. Afinal de contas, foi no Dia do Pai de 2022 que me meti numa carrinha alugada no aeroporto de Cracóvia e, com uma colega de trabalho, conduzimos os 3400 quilómetros desde um campo de refugiados de Przemyśl, na Polónia, até à aldeia de Maceda, em Ovar, com 7 ucranianas mais um bebé de 4 meses dentro da barriga de uma delas. O pequeno Anatoly já nasceu em Portugal e, no Verão passado, ajudei-o, e ao resto da família, a regressarem a Kiev.
Mas dir-se-ia que a minha coragem fraquejou quando olhei para o meu filho de 5 anos e meio e dei por mim a imaginar o momento em que me pergunta “Que é aquela luz tão rápida no céu, papá?”
Talvez o mais rocambolesco neste cenário é que é real.
Tão real que pode mesmo acontecer a qualquer segundo, agora que o “idiota útil” que está sentado na Sala Oval demonstrou de forma claríssima que a sua missão é facilitar a vida do tio Vlad e restantes comparsas, que o financiam desde o início da carreira.
Resta-me esperar que os nossos dirigentes tenham o discernimento de escolher bem as suas palavras e não nos metam (mais) na mira do Conde Vlad do que já estamos. É caso para evocar as sábias palavras do John Lennon e pedir a todos os carolas no palco mundial que dêem uma hipótese à paz. Se haverá discernimento para tal, ou se vamos enfrentar um inferno dantesco, é o que vamos saber nos próximos dias…
#medo
#enãoépouco